Por causa das obras no restaurante usaram-na para transportar entulho (e não-sei-quê mais que devia cheirar muito mal) e agora cheira mal.
Na primeira semana, há 3 semanas atrás, era quase insuportável.
Na semana passada estava melhor, mas ainda forte.
Ontem cheirava mal, mas fomos todas lá dentro, vidros quase sempre fechados por causa do frio.
Feijoada de soja com arroz. Da feijoada só tinha o feijão. E o tomate. Legumes, zero. Não há Banco desde há 15 dias.
Chá de erva-doce quentinho. Não há fruta para sumo.
Pouca gente por ser a última quarta do mês e muito tempo para ouvir histórias.
Tive um ataque de riso com o maior chorrilho de desgraças que já ouvi juntas. Não digo que não fosse verdade, não digo que tivesse piada. Talvez fosse uma reacção estranha ao choque que tal despojo me causou. Desgraça atrás de desgraça e ele ali estava, de pé.
Eu estava sentada ao volante da carrinha, pronta para irmos embora, e quase chorei a rir baixinho.
Depois o psicopata da hora. Carregal e o idiota que na semana passada invadiu a privacidade de uma de nós, deitando-lhe a mão ao maço que ela tinha no bolso de trás, desculpa-se dizendo que não é como se ele fumasse, era só a brincar.
A propriedade é mais privada do que a privacidade, no mundo.
Aturo-o o resto da noite colado a mim, que tiro chás com vontade de lhe dizer que se volta a tocar em alguém leva uma carga de porrada de uma mulher como nunca julgou possível.
Tiro chás.
Conta que há dias subiu a uma varanda de um segundo andar de um prédio pelas caleiras. Regozija-se com o susto que as estudantes Erasmus da casa apanharam.
Tenho medo que partir-lhe os bracinhos não seja suficiente. Assusta-me.
O meu pior medo ainda é de palhaços, pun totally intended. Mascaram-se de bons e amigos e podem ser monstros por trás do sorriso pintado.
No Aleixo a tensão é sólida, muitos gritos e eu a calcular como vou meter toda a gente dentro da carrinha no menor espaço de tempo possível. Elas estão calmas. As panelas e a mesa ficam, quero lá saber.
Plano de emergência alinhavado, relaxo e espero que se acabe a comida.
Debatemos os cobertores que sobraram, damos a este ou ao outro que nos pediu para os guardar e não voltou?, e tentamos abrigar-nos da chuva.
A caminho do restaurante, a carrinha agora quase vazia, não fora a roupa toda de mulher que sempre nos sobra, queixam-se do cheiro outra vez.
Mando-as calar, que não me cheira a nada.
Quando alguém sabe que não tenho olfacto, o mais engraçado é observar a reacção como quem acabou de ouvir da condutora da carrinha em movimento que desde que ficou cega não vê nada.
Mando-as calar e elas riem-se.
Nem sabes a sorte que tens, dizem.
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