Já há muitos anos que fazemos este pequeno truque (we'll be here all week).
Falamos de morrer, ela diz-me "não morras, senão mato-te", às vezes fica mais séria e diz que não sabe o que faria se eu morresse, pois nem eu se fosses tu, mas no geral acabamos a conversa com o habitual "eu quero ser cremada".
Começou tudo num belo fim-de-semana prolongado de Novembro, feriado dos finados, muito apropriado.
Fui passar uns dias com ela no Luxemburgo e estava um Novembro atípico, parecia Primavera de dia e à noite ameaçava nevar. (Os Novembros sucedem-se na nossa vida.)
Havia electricidade no ar, aquela electricidade típica de quando está muito frio e o tempo está a tentar decidir se neva ou se aquece. Noites mágicas, azul-negras, lindas, nós a passear pelo bairro das embaixadas e o ar frio e eléctrico à nossa volta.
Desde essa altura perdi o pânico de morrer. Continuo a preservar o instinto de sobrevivência, o impulso da morte do Freud (tenho de verificar isto, que as aulas de Psicologia do 12º ano já vão longe), mas não tenho medo de morrer.
Se morrer, morro. Vou fazer húmus, que é uma espécie de cocó.
Perco algumas coisas, isso de certeza, como a capacidade de respirar e o ritmo cardíaco. Mas morro e pronto.
Se ela morrer (ou outro dos meus irmãos ou pais ou primos ou tios ou avós), morro um pouco por dentro de certeza. Ou então morro com ela e assim ninguém se fica a rir.
Só não dá jeito porque ambas somos guardiãs do testamento em vida da outra. Para não haver confusões,
queremos ser cremadas.
:)
ResponderEliminarQue texto bonito.
Acho que intimidade é isso. Ser guardião do testamento em vida dos outros.
Eu e a minha irmã, que não é minha irmã, mas é como se fosse, também queremos ser cremadas.
Obrigada. :)
ResponderEliminarJuntem-se a nós.
;)
Sim, este post é lindo! E como foi "post pedido", fico muito agradecida.
ResponderEliminarTemos de fundar o Clube das Irmãs que Querem ser Cremadas (sejam ou não irmãs, que é para a irmã-da-mar-que-não-é-mas-é-como-se-fosse também poder ter cartão de sócia).
Ave, Ju, morituri te salutant! And long live the queen of blogs!
A mana,
Ibidem