Mais uma noite em que duvido do que faço ali, duvido das razões, dos princípios, da motivação.
Está frio e tratam-nos mal. Tenho sono e estou cansada e vou lá apanhar frio e tratam-nos mal.
Estamos cansados e ainda temos tanta comida e ameaçam-nos.
Queixam-se da roupa, queixam-se das regras, "Casacos só pode levar um, está bem?", questionam a nossa vontade de dar.
Não somos voluntários cheios de boa vontade e até amor para dar, somos carrascos e polícias, controlamos, moderamos, somos insultados.
Não saímos de S. Bento sem ouvir "É preciso gostar do que fazem", de alguém que diz ter em casa botas de 200 contos, "só estou aqui porque preciso" - desdenha, envergonha-se, mas quer levar tudo. Não pode, "temos mais pessoas".
Julgo que julgam que somos pagos para fazer aquilo. "É preciso gostar do que fazem!"
No Sto. António gritam-nos por não sabermos que sim, o senhor também dorme aqui.
Esgota-se a paciência.
No Aleixo somos ameaçados por um morador, "qualquer dia passamo-nos dos cornos e deitamos fogo a isto tudo". Nós calados.
Questionamos o que fazemos ali, só queremos ir embora mas ainda há tanta comida...
À saída, polícia. Nove pessoas em seis lugares. "Fomos distribuir comida", o polícia ri-se e diz que levamos ali um regimento. Seguimos.
Já é meia-noite quando chegamos a Júlio Dinis. Mais reclamações e nós fartos, cansados, esgotados, burned out.
No caminho de regresso, para consolar, cantamos alto e bom som todas as músicas de Natal que conhecemos. Aquecemos.
Não posso parar para decidir - para a semana sou cozinheira, que a chefe vai de férias.
A vida continua e eu não tenho tempo para pensar.
Talvez seja melhor assim.
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