segunda-feira, junho 29, 2009

Francisco

Cansado. Estava cansado. Queria chegar a casa e ser um estereótipo, não ser ele mesmo, chegar e dizer "puuff, estou derreado, não me chames para jantar, vê se sossegas os miúdos que eu não posso ouvir ninguém, leva tu o cão à rua, fazes favor", mas não havia cão, por isso ele diria "o lixo", ao que ela lhe responderia, incrédula de certeza, "eu não fiz jantar, os miúdos já vivem há muito nas casas deles e quem leva o lixo é a empregada, de manhã - o que é que tu tens?".
E é por estas e por outras que ele chegava sempre a casa com um sorriso colado à cara, dizia "olá, querida, como foi o teu dia" sem esperar ou ouvir a resposta, enfiava-se no escritório e delapidava o whisky como quem bebe água. Só conseguia ser o estereótipo que não conseguia ver.

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